Planejamento Sucessório – Holding Familiar

O objetivo deste breve texto é fazer uma análise sobre a vontade do controlador de um determinado patrimônio, cuja intenção é favorecer financeiramente os herdeiros, assim como a vontade destes em participar da holding familiar, colocando na balança a redução das questões burocráticas e demoradas de uma sucessão tradicional, redução dos custos, não incidência de determinados tributos, redução de alíquotas, e acima de tudo manter a perpetuidade do patrimônio, assegurando mais tranquilidade aos sucessores.

Há dois aspectos a serem abordados.

O primeiro aspecto diz respeito à holding familiar criada exclusivamente para a finalidade de organização patrimonial da família nuclear, ou seja, pai, mãe e filhos, com a primordial finalidade de garantir a perpetuação dos bens e a tranquilidade financeira para os herdeiros.

Nesta primeira hipótese, há apenas o interesse em manter o patrimônio dentro da família.

Nesse caso, a hipótese é de existência de bens móveis, imóveis, participações societárias, investimentos pertencentes ao casal, que tem filhos, e que pretendem garantir o futuro dos filhos de forma objetiva, sem a necessidade de inventário, e com redução de custos tributários. O desejo é facilitar a transmissão do patrimônio e possibilitar a sua manutenção na família, transferindo-se as cotas, ao invés dos bens.

Como se dá essa transferência ou reorganização, nesta primeira hipótese?

Nesta hipótese, os pais e os filhos traçarão um plano sucessório, em conjunto, com a participação de todos nesse planejamento. Aqui, a holding será instituída para essa finalidade. Para essa hipótese, será feita uma análise dos bens, seus valores, quais os bens se destinarão a compor a holding, quais os bens serão vendidos, alugados, além da análise e conclusão de quem integrará a empresa apenas como acionista, ou também como gestor, avaliando os perfis de cada herdeiro com a sua atuação no negócio, enfim haverá uma convergência de interesses porque todos querem manter o patrimônio assegurado, rendendo frutos para após a passagem do seu titular.

Neste caso, a análise que faço é a de que haverá a tendência dos herdeiros em aceitar a constituição de uma holding familiar porque estão diante de um interesse mútuo em manter o patrimônio dentro da família.

Todos terão vantagens, uns porque lhe serão atribuídas funções de gestão, para aqueles que tiverem o perfil, outros porque apenas participarão como cotistas, mas todos se beneficiarão financeiramente. Ou seja, se o objetivo da holding é apenas a concentração do patrimônio, visando a sua proteção, aumentam as chances de interesse dos herdeiros em participar da empresa, pois ela é constituída para essa única finalidade.

Há, aqui, a presença da “affectio societatis”, requisito indispensável para a constituição de qualquer pessoa jurídica.

O segundo aspecto que se pretende abordar é o da criação da holding familiar para não só administrar o patrimônio de seu controlador, mas também com a finalidade de participação em outras sociedades já previamente existentes e cujos sócios são membros da família estendida, como por exemplo, irmãos.

Nesta segunda hipótese, o objetivo é maior, porque não se restringe apenas à concentração dos bens da família nuclear e sua proteção, mas há outra(s) empresa(s) existente(s) da(s) qual(is) a holding familiar será cotista.

Nesse exemplo que é dado, suponha quatro irmãos que resolvem empreender e criam duas empresas, uma de confecção e outra de venda de roupas. Passados muitos anos, esses irmãos, já com seus filhos e netos, resolvem planejar a sucessão dessas empresas, e, portanto, cada qual institui uma holding familiar transferindo seu patrimônio pessoal e participações societárias.

Nesta segunda hipótese, como se dá a transferência ou a reorganização?

Aqui, o panorama é mais abrangente e complexo porque envolve o planejamento sucessório de quatro famílias, que desejam proteger seus sucessores, porém, não há somente patrimônio a ser resguardado, e irmãos envolvidos, como no primeiro exemplo, mas também a participação desses herdeiros que serão irmãos e primos, convivendo empresarialmente com tios, e sobretudo o interesse em participar dos negócios da família, que não se restringirão tão somente a gerir patrimônio.

Neste caso, é preciso mais do que a vontade dos herdeiros em manter o patrimônio resguardado, exigindo-se participação nos negócios da família, adquirindo cotas de empresas que podem não ter interesse em participar, tampouco em serem sócios dos primos e tios, ou seja, a ausência de “affectio societatis”.

Enfim, é preciso que haja uma condução dos patriarcas para que os filhos participem ou se interessem pelos negócios da família, e o respeito àqueles que não se interessarem em adentrar aos negócios por quaisquer motivos pessoais, a exemplo de já possuírem renda própria ou estarem realizados nas profissões escolhidas.

Não basta somente a vontade dos controladores e a imposição aos herdeiros de terem de assumir esses negócios, com o propósito de resguardar e perpetuar o patrimônio. É preciso que se atentem ao desejo dos filhos em não participar e não contribuir com o planejamento arquitetado em seu benefício, devido à absoluta ausência de vontade em participar das sociedades.

Esse aspecto humano é um fator a ser observado sempre.

O Avanço Cultural e Social que modificaram o Conceito da Família Contemporânea e o Óbice Imposto pela Lei quanto ao Reconhecimento das Familias Simultâneas e Poliafetivas

Aborda-se neste breve texto o reconhecimento pelos Tribunais acerca das mudanças social e cultural ocorridas no Brasil quanto ao conceito contemporâneo das entidades familiares e a dificuldade encontrada em aplicá-lo em sua plenitude, diante da nossa Legislação que permanece desatualizada e contrárias a alguns avanços.

Em primeiro lugar, é importante avaliar que abandonamos aquela sociedade patriarcal, na qual o homem era o chefe da família e a ele cabia o poder de conduzi-la, tendo havido simultaneamente o avanço da emancipação feminina, com conquistas relevantes no aspecto profissional, com a abertura gradativa das oportunidades às mulheres, além da possibilidade da libertação da sexualidade feminina com o surgimento da pílula anticoncepcional.

Essas mudanças sociais refletiram na configuração do que entendemos como entidades familiares nos dias de hoje. Antes prevalecia o patriarcalismo, e o poder nas mãos dos homens, as crianças eram objeto de direito, as mulheres obedeciam, não eram consideradas plenamente capazes após o casamento, eram páreas da sociedade em casos de desquite, dentre outras situações de subjugação.

No entanto, hoje em dia prevalece a igualdade de direitos entre homens e mulheres na condução da sociedade conjugal, conforme dispõe o art. 226, § 5º da Constituição Federal, além do entendimento consolidado de que as famílias têm na sua base o afeto e a solidariedade.

Não faltam exemplos dessa mudança de entendimento do que se considera uma entidade familiar nos dias de hoje. Há famílias oriundas da união estável entre pessoas do mesmo gênero e de gêneros distintos, assim como casamentos entre pessoas de gêneros idênticos ou diversos, há as famílias monoparentais, formadas por um dos genitores e seus filhos, há as famílias solitárias ou unipessoais, constituídas por pessoas solteiras, viúvas, separadas, celibatárias, tendo havido o reconhecimento pelo STJ através da súmula 364, que prescreve que “o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.” Enfim, toda essa evolução está baseada nas mudanças sociais, seguidas pelo reconhecimento, ainda que tardio, da Constituição Federal (art. 226 e incisos), do Código Civil de 2002 e das recentes decisões dos Tribunais Superiores, que reconheceram, por exemplo, a união estável e o casamento entre pessoas do mesmo gênero.

No entanto, a nossa Legislação ainda mantém a monogamia como elemento constitutivo de qualquer entidade familiar, presente nos artigos do Código Civil que tratam do concubinato e da fidelidade recíproca.

O art. 1.727 determina que as relações eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar-se, constituem concubinato. Já, o art. 1.566, I, do mesmo diploma, determina que são deveres de ambos os cônjuges a fidelidade recíproca.

Portanto, o que se vê, atualmente, em decisões recentes que impedem o reconhecimento de famílias simultâneas e de famílias poliafetivas, é, em boa medida, a barreira existente na legislação.

Vejam que na decisão da 8ª Câmara do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, processo nº70082663261, em que foi reconhecida a simultaneidade de uma união estável e de um casamento, houve a constatação de que os companheiros conviveram durante 14 anos, moraram juntos, enquanto ele se mantinha legalmente casado, e a esposa sabia da relação dele com outra mulher.

Os Desembargadores sustentaram que se fazia necessária a “preservação do interesse de ambas as células familiares constituídas”.

Houve o posicionamento divergente do Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, cujo entendimento foi o de que “o direito de família brasileiro está baseado no princípio da monogamia, e que se não são admitidos válidos dois casamentos simultâneos, não há coerência entre a admissão de uma união estável e de um casamento, sob pena de se admitir mais direitos a essa união de fato do que ao próprio casamento”.

Essa opinião divergente segue a linha atual do STJ e do CNJ, que se baseiam na Lei, mitigando o modelo atual de entidade familiar baseada no afeto e na solidariedade. Seguem trechos do recente Julgado do STF, com repercussão geral que afastou a concomitância de duas uniões estáveis, e da decisão do CNJ sobre a impossibilidade de se lavrar Escrituras para a constituição de famílias poliafetivas.

“Em que pesem os avanços na dinâmica e na forma do tratamento dispensado aos mais matizados núcleos familiares, movidos pelo afeto, pela compreensão das diferenças, respeito mútuo, busca da felicidade e liberdade individual de cada qual dos membros, entre outros predicados, que regem inclusive os que vivem sob a égide do casamento e da união estável, subsistem em nosso ordenamento jurídico constitucional os ideais monogâmicos, para o reconhecimento do casamento e da união estável, sendo, inclusive, previsto como deveres aos cônjuges, com substrato no regime monogâmico, a exigência de fidelidade durante o pacto nupcial (art. 1.566, I, do Código Civil).”

“11 A sociedade brasileira tem a monogamia como elemento estrutural e os tribunais repelem relacionamentos que apresentam paralelismo afetivo, o que limita a autonomia da vontade das partes e veda a lavratura de escritura pública que tenha por objeto a união “poliafetiva”. 12. O fato de os declarantes afirmarem seu comprometimento uns com os outros perante o tabelião não faz surgir nova modalidade familiar e a posse da escritura pública não gera efeitos de Direito de Família para os envolvidos. 13. Pedido de providências julgado procedente.

Enfim, é preciso que haja a atualização da legislação, afastando conceitos ultrapassados como o patriarcalismo e a monogamia, no intuito de permitir os arranjos familiares que se pretendam formar ou coexistir com base no afeto, na solidariedade e na verdade, com o consequente reflexo patrimonial, cabendo à cada um, de forma particular, resolver como pretende unir-se ou manter-se unido ao outro, em busca da felicidade e da plenitude.

1 RE 1045273/SE – SERGIPE – STF. Relator(a) Min. Alexandre de Moraes.
2 Processo nº 0001459-02.2016.2.00.0000. Pedido de Providências. CNJ

Constelação Familiar como meio de Resolução de Conflitos

Qual a importância da Constelação Familiar para a resolução de
conflitos?

Todos nós possuímos um histórico familiar e muitas vezes estamos tão emaranhados, ou seja, vinculados a essas histórias de entes queridos, na maioria das vezes inconscientemente, que não conseguimos entender o porquê temos determinados comportamentos ou o porquê nos colocamos em determinadas situações, o que nos causa muito sofrimento.

A base da Constelação Familiar, segundo Bert Hellinger, seu idealizador, se assenta sobre três pilares: “Em todos os nossos relacionamentos, as necessidades fundamentais atuam umas sobre as outras de maneira complexa:

  1. A necessidade de pertencer, isto é, de vinculação.
  2. A necessidade de preservar o equilíbrio entre o dar e o receber.
  3. A necessidade da segurança proporcionada pela convenção e previsibilidade sociais, isto é, a necessidade de ordem.”

Esses três itens acima representam as chamadas Ordens do Amor. O pertencimento significa que temos a necessidade de pertencer ao nosso grupo familiar, ou a outros grupos.

Bert Hellinger diz: “A primeira coisa que observei foi a existência de um vínculo profundo entre as crianças e sua família de origem.

A pior coisa que pode acontecer a uma criança é ser excluída da família.

Isso é fundamental para ela. A criança vive com a consciência: ‘A este grupo eu pertenço, a ele quero pertencer e compartilhar do destino desta família, seja ela qual for’.”

A segunda ordem é a do equilíbrio, ou seja, dou amor até o limite em que o outro esteja preparado para receber, inclusive devo restaurar o equilíbrio quando recebo algo negativo do outro.

Vejamos o que ele diz: “Se alguém me maltrata, tenho necessidade de me desforrar.

É uma necessidade de vingança.

Se ela for satisfeita, o equilíbrio é restaurado. Se alguém comete uma injustiça comigo e eu simplesmente perdoo, fico numa posição superior e o outro não pode fazer mais nada para restabelecer a igualdade entre nós, a não ser ficando mais zangado comigo(…). Por amor, dou um pouco a mais do que recebi e, quando injustiçado, dou um pouco a menos (…). O equilíbrio precisa ser restaurado tanto no bem quanto no mal.

O amor só floresce quando o equilíbrio pode ser restaurado, na medida em que dou ao outro um pouco mais do bem que recebo e um pouco menos do mal. Assim o amor pode ter uma chance também no equilíbrio do negativo”.

Por fim, o terceiro pilar é o da hierarquia, em que os mais novos devem respeitar os mais velhos.

Tenho observado que a terapia da Constelação Familiar é capaz de resgatar questões que permanecem no inconsciente de um determinado grupo familiar e que se propagam para gerações futuras sem que as pessoas saibam.

O aspecto fenomenológico que envolve esse sistema e que vem à tona no momento da vivência é sentido por todos, ou pela maioria, que se dispõem a participar como representantes.

Convido a todos que se interessarem pelo estudo da Constelação Familiar que participem da terapia, como ouvintes, observadores, ou como representantes, ou seja, não necessariamente como constelado num primeiro momento, pois ao entrar no campo morfogenético daquele sistema, que em poucas palavras significa a memória do inconsciente daquele grupo familiar, você acessa essa memória e sente profundas emoções, tais como sensações físicas de arrepios, adormecimentos, sonolência, suores, calor, frio, raiva, medo, alegria, angústia, tristeza, repulsa, enfim, sensações reais que te deixam perplexos e curiosos de saber o porquê.

É antes de tudo um processo de cura das dores da alma, tendo o amor como condutor. Por isso acredito nessa ferramenta como meio de solução de conflitos, em conjunto com outras como a mediação, a advocacia colaborativa e a comunicação não violenta, pois as pessoas precisam resolver, em primeiro lugar, seus dilemas emocionais para poderem dar continuidade a um processo de ruptura familiar e seguirem em frente.

1 Bert Hellinger – A Simetria Oculta do Amor. Pág. 25. Editora Cultrix. 6ª Edição 2006.
2 Bert Hellinger e Gabriele tem Hovel – Constelações Familiares, O Reconhecimento das Ordens do Amor, Conversas sobre Emaranhamentos e Soluções. Pág. 38. Editora Cultrix. 1ª Edição 2001.
3 Bert Hellinger e Gabriele tem Hovel – Constelações Familiares, O Reconhecimento das Ordens do Amor, Conversas sobre Emaranhamentos e Soluções. Pág. 38. Editora Cultrix. 1ª Edição 2001.